sábado, 7 de agosto de 2010

A GÊNESIS DO CRIME ORGANIZADO NO BRASIL



“400 CONTRA 1”
A GÊNESIS DO CRIME ORGANIZADO NO BRASIL
por Amin Stepple



Nas últimas décadas, o crime organizado avançou rápido no Brasil, numa multiplicação de siglas que transformou os relatórios policiais numa sangrenta sopa de letras. Os bandidos têm sido bem mais eficientes nos gatilhos do que os mocinhos, que, no caso, deveriam ser os nossos cineastas. Com complexo de superioridade em relação à televisão (que não tem pudor em sujar de vermelho a tela), o cinema ainda busca temas nobres, daí certo esnobismo ao menoscabar esse fenômeno da criminalidade brasileira, que transforma o cotidiano das grandes cidades numa Cabul tropical.

O filme “400 contra 1”, do diretor Caco Souza, tem, logo de saída, o mérito de descer aos labirintos das profundezas do submundo do crime organizado. É a história da formação da primeira grande organização criminosa que surgiu no país, em meados dos anos 70: o Comando Vermelho, cujo lema Paz, Justiça e Liberdade domina hoje boa parte dos morros cariocas. Curiosamente, como se quisesse involuntariamente expiar a quase inexistência de filmes sobre o assunto, “400 contra 1” se propõe a narrar a gênesis, como surgiu o crime organizado no Brasil. A base do roteiro é o livro de igual título do assaltante de banco William da Silva Lima, o “professor”, fundador do Comando Vermelho e único sobrevivente do grupo de “pioneiros”.

“400 contra 1” não economiza nas tintas. É um filme de ação, entenda-se por isso que o trunfo é pau e os diálogos são apenas os necessários para que o “homem cordial” mostre a sua verdadeira cara. As sequências são hiperrealistas e, sejamos honestos com o produto nacional, convincentes e muito bem realizadas, na interpretação e na técnica. Aliás, em alguns momentos, mais eficazes do que as produzidas pela televisão brasileira. Vejam com olhos livres as cenas de fuzilamento do apartamento onde se refugiava a liderança do Comando Vermelho, na Ilha do Governador. O cinema americano informará, como dizia o poeta Oswald de Andrade. O diretor Caco Souza não discorda do antropófago modernista.

A direção naturalista dos atores principais e das dezenas de coadjuvantes acerta no alvo. Daniel Oliveira, no papel do líder histórico do Comando Vermelho, o “professor”, é um exemplo de que os personagens ficcionais, ao contrário do que ocorria em certa fase do nosso cinema, precisam estar à altura do talento dos atores que os encarnam. As cenas de combate dentro das masmorras não ficam nada a ver às de outros bons filmes, como “Carandiru”. Aliás, o cinema brasileiro adquiriu o estranho know-how de filmar com perfeição massacres em presídios, mais um reflexo antropofágico de nossa guerra particular. O cinema brasileiro ainda informará?

“400 contra 1” ainda desmitifica uma lenda prisional, cultuada pela literatura esquerdista, de que foram os chamados subversivos presos pela ditadura nos anos 70 que fizeram a cabeça dos presos comuns nos cárceres da Ilha Grande, no Rio de Janeiro. Isso teria acontecido graças à convivência pacífica entre os dois grupos. O filme mostra o contrário. Houve influência, sim, no sentido da organização e do aperfeiçoamento da estratégia dos assaltos a banco. Um dos bandidos dissidentes chega a ironizar o manual de guerrilha urbana de Marighella. Aliás, premonitoriamente, já que os próprios remanescentes da esquerda armada hoje consideram o manual uma peça mais próxima da ficção. O filme mostra que a tensão era permanente entre bandidos e guerrilheiros urbanos, como se aqueles não compreendessem estes, que pretendiam salvá-los das garras infames do sistema capitalista, para levá-los ao sonho libertário do socialismo.

O roteiro de “400 contra 1” conta com o auxílio luxuoso do escritor pernambucano Julio Ludemir, cujos livros abordam e expõem, de forma corajosa, as entranhas do crime organizado nos morros cariocas. As críticas ao filme, recém-publicadas, caem na mesmice de tentar transferir o filme como um produto que seria mais bem-sucedido no formato de seriado de televisão. O velho preconceito elitista do tema nobre, reserva (inútil) de mercado do cinema brasileiro. Enquanto existir esse falso dilema, os filmes não conquistarão o espectador que não se resigna a ficar sentado no sofá diante da televisão. Também se falou muito do vaivém cronológico do filme, com ações alternadas em anos diferentes. De fato, isso pode causar certa confusão temporal na cabeça do espectador, habituado a narrativas mais lineares. Mas, aqui, resta o consolo da frase de Godard: “todo filme tem começo, meio e fim, não importa a ordem”.

Por último, o bom filme de Caco Souza faz uma discreta homenagem a Omar Cardoso, um radialista famoso nacionalmente nos anos 70, que contribuiu para popularizar o horóscopo. “400 contra 1” relata como o ovo da serpente foi chocado. Mostra ainda que, se os militares durante a ditadura derrotaram a esquerda armada, eles perderam a guerra contra os bandidos organizados. O cinema brasileiro começa a assinar esse recibo.

5 comentários:

Unknown disse...

eu vi as gravações na ilha grande onde moro e acho que vai ser muito bom esse filme.

Markinhos disse...

Para mim fica uma dúvida!!!
Será que o filme não acarretará, contribuirá para um movimento de ousadia para os grupos do crime organizado? Ou seja será que eles vão ver o filme e então se orgulhar e assim fazerem algum tipo de ação enautecendo ainda mais o grupo ou ao crime? Tenho certo receio. Pois assim aconteceu com o Tropa de Elite, que até hoje é super bem visada pela própria corporação e odiada pelos policiais militares. O mesmo pode ocorrer entre as facções, estou errado? Eles podem achar que é a hora da vingança ou algo parecido!

Anônimo disse...

lixo...pais de bandidos... filme sobre bandidos!

cleiton disse...

cleiton macedo-são paulo

primeiro os parabens pelo filme pois li o livro ja faz um tempo e achei da hora ter feito apesar de ainda não assistir!!!
Mais quero saber uma coisinha só pelos personagens que vi no traller,nas fotos e nas entrevistas,parece que vcs esqueceram de alguem nessa filmagem o Jorge Saldanha lendario ¨Zé do Bigode¨ se isso aconteceu foi uma fallha tremenda ou simplesmente ficaram com medo da repercursão ¨uns cagão¨,pois ninguem enfrenta 400 policias sozinho uma noite toda levando,uns 15 pro inferno antes de ser derrubado....alias esse é o motivo verdadeiro do nome do livro pra quem não sabe!!!!
me responda ai se possivel.

odiamaisbelo@hotmail.com

Carioca do Morro da Cruz disse...

filme muito bom tem que olha o com testo do filme é verdade tudo a quilo não se pode so jugar é o sistema esta falindo